Cascais na boca do mundo



*GONÇALO PINTO FERRÃO
Comemoram-se esta semana, nomeadamente de 15 a 17, 47 anos que ocorreu o Woodstock, numa fazenda junto à pequena vila de Bethel (estado de Nova Iorque), evento que marcaria o grito de liberdade de uma geração do pós-guerra que continuava fustigada pela resultante capitalista do mundo ocidental dito civilizado, juntando este grito a outro ocorrido no ano antes, em Paris.


O que é que o Woodstock tem a ver com Cascais? Provavelmente nada e certamente tudo!


Em 1970, um ano depois do Woodstock, com o apoio da Congregação Salesiana, alguns músicos portugueses tentam organizar um festival pop/rock na mata anexa à escola do Estoril, mas assim que a PIDE soube que iriam estar presentes Zeca Afonso e Adriano Correia de Oliveira, entre outros, proíbe esta realização, manifestando, uma vez mais, a repressão social então vivida. 


No entanto um ano depois, Luiz Villas-Boas e João Braga conseguem levar a cabo um festival de jazz, juntando gente, que nem sempre se revia no género musical, mas sim uma forma de “agitar” o status quo e o cinzentismo em que Portugal vivia. Depois de 74, veio todavia a afirma-se, também, como um acontecimento internacional de inegável qualidade, dos mais prestigiantes do País e do mundo, durante os dezassete anos e as dezoito edições da sua duração.


Esta internacionalização do Concelho, integrada nas várias iniciativas de colaboração entre a então Junta de Turismo da Costa do Sol (mais tarde Junta de Turismo da Costa do Estoril), entidade pública e a Sociedade Estoril-Sol e outros grupos e entidades privadas, enquadrava-se num Plano Turístico, não exatamente modelar mas, quase sempre, conseguido propondo-se pagar a si próprio.


Para além do Cascais Jazz, exemplos como os grandes concertos das grandes bandas de rock mundial, das exposições internacionais, do Rali de Portugal, do Grande Prémio de Portugal de Fórmula 1 (a partir de 1984), dos festivais de cinema, teatro e música erudita, etc., Cascais teve um plano estrutural reconhecido de iniciativas visando o incremento e a sustentabilidade turística do concelho. Cascais estava na boca do mundo com uma das zonas top do turismo europeu.


Hoje, quando a Câmara Municipal de Cascais fala em turismo, nas valências da iniciativa privada, pretendendo recordar este passado, esquece-se sempre de referir o bom exemplo de parceria entre o público e o privado desse passado, sem qualquer ensejo de “assaltar” o bolso dos munícipes contribuintes. Esquece-se de incentivar o privado, naquilo que ao privado pertence, deixando à sua responsabilidade pública, tão só o que lhe compete.


Hoje, resta-nos o desproporcional encargo das Festas do Mar, sem enquadramento nem planificação, sem sustentabilidade, sem auto retorno do investimento e sem o prestígio internacional das iniciativas de outrora. Comparar estas Festas do Mar, ditas gratuitas, com quaisquer outras festas de vilas e aldeias de Portugal, não será mera coincidência e muito menos má vontade. Pelo contrário, é reconhecer conscientemente Cascais como já não estando na boca do mundo, mas onde muitos outros concelhos estarão certamente!

*Deputado Municipal Bloco de Esquerda (BE)

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1 comentário:

  1. Com José Jorge Letria ainda tive alguma esperança de Cascais ter uma estratégia de cultura onde o urbano (modernidade) e o tradicional pudessem ter expressão. Nota: Com certeza, conhece António Ferro, ministro da propaganda de António Oliveira Salazar? :)

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